terça-feira, 3 de maio de 2011

Torres (18 de março de 1894)


Bernardino de Senna Campos
Chegamos à Vila de Torres, às 7 horas da noite, do dia 18 de março de 1894. Saiu nesta ocasião uma carreta, conduzindo o General Artur Oscar, comandante da Divisão do Centro, estacionado em Torres, que ia doente para Porto Alegre, passando o comando ao Coronel Salustiano.
Chegando a Torres, hospedei-me num quarto da estação, e não fui muito bem recebido pelo meu colega Manoel A. de Souza, apesar de esse colega de Torres dar-se muito comigo pelo aparelho, quando estava em Porto Alegre ...
(Depois soube que foi devido a intrigas feitas de Porto Alegre por um colega, por nome Gaudino, que já esteve em Torres com o Souza).
A Vila de Torres é pobríssima e está situada em cima de uns rochedos junto ao mar. São três montes que se erguem na praia isolada, sendo o do Norte onde está edificada a vila. De longe e do mar os três montes parecem torres. Daí veio o nome. Tratam as torres como sendo do Norte, do Centro e do Sul. A vila, como disse, é na encosta da do Norte, lado da Serra, fazendo frente ao poente.
Tem uma única rua, de norte a sul, as casas do lado de baixo são nos fundos assobradadas e dão para uma lagoazinha que há abaixo do dito monte. Em cima deste está edificada a igreja de São Domingos, padroeiro da vila.
Há umas casinhas ao norte dela, ao norte da vila 2 quilômetros, no lugar que chamam Potrêiro, passa o Rio Mampituba, que faz divisa com o município de Araranguá, em Santa Catarina.
Próximo à igreja, para leste, descortina-se todo o oceano, para oeste, a cordilheira da Serra, para o sul, a praia sem fim, que vai a Tramandaí, Cidreira, e, afinal, Rio Grande, e para o norte, as praias pertencentes já à minha terra, Santa Catarina.
Avista-se também dali, a meia-légua mais ou menos da costa, uma parcela de pedras, onde dizem haver muitos lobos marinhos!

Divisão do Centro/ Artur Oscar

Estacionava naquela ocasião, em Torres, uma coluna do exército, com 2.000 homens, composta do 4°, 11° e 25° Batalhões, tendo a totalidade da oficialidade do 25° catarinense. Estavam ali para guarnecer as fronteiras do Estado.
Tinham regressado de Tubarão e Araranguá, onde tinham ido em perseguição dos revolucionários, tendo neste último lugar dado combate ao vapor "Itapemerim", armado em guerra.
Na estação de Torres, a qual estava instalada na primeira casa da vila, ao sul, com fundos para a lagoa, havia, como carteiro, um bom pardo, chamado Lourenço. Este obteve-me pensão em casa de um velho negociante da Capital, que estava com negócio ali e era fornecedor da Divisão, chamado Leonidas Brandão, pagando 50 mil-réis mensais, visto não haver hotel em Torres. Isto para as refeições.
Meu colega de Torres, que era casado há um ano, cuja mulher estava de cama por recaída de parto, tinha dado à luz poucos dias antes da minha chegada, cedeu-me um quarto para residir na estação.
Em Torres travei relações com todos os oficiais, especialmente do 25°, e com alguns catarinenses foragidos ali, vindos de Laguna, Tubarão e Araranguá, entre eles o Dr. Polidoro de Santiago, que morava na Laguna. Na margem esquerda do rio Mampituba, pouco distante, estava acampado um Corpo Cívico de 200 homens, organizado na Vila de Araranguá, pelo filho daquele lugar, Apolinário João Pereira, que era comandante, com o título de Coronel.
Todas as tardes, quando estava de folga, passeava a cavalo com alguns oficiais. Às vezes transpunha o Mampituba e vinha beber em Santa Cata­rina.
A esquadra dos revoltosos, tentando a última cartada, atacaram a cidade de Rio Grande, de que foram rechaçados. A Divisão teve, na tarde de 4 de abril de 94, a ordem de seguir para o sul, isto é, para Porto Alegre. Com eles seguiu também meu fornecedor Brandão. Passei a comer em casa de uma viúva que morava em frente à estação, pagando 60 mil-réis mensais.

Regresso da Divisão a Porto Alegre

Partindo a Divisão na manhã de 6 de abril, debaixo de música, toque de corneta, foguetes, mulheres e crianças montados em bois, cavalos magros, etc., parecia um bando carnavalesco. Ficou a vila de Torres tristís­sima, só com os poucos moradores, e, guarnecendo-a, o 16° Batalhão da Guarda Nacional, organizado ali mesmo, sendo comandado pelo Coronel Capa Verde, que foi meu colega telegrafista. ( ... )


Bernardino de Senna Campos
Organizado pelo Pe. João Leonir Dall’Allba
Memórias do Araranguá

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